Elisa Pereira (foto), 74, pescou a "vida toda". Aposentou-se das águas. A seca "deixou o açude Banabuiú" longe 3 km da casa dela
Fosse por ela, já havia partido para tão longe dali. Tentar um prazer na sina, até agora, sem facilidades. Ainda se atreveria, mesmo aos 74 anos e aposentada das pescarias de quase uma vida inteira, na imensidão do açude de Banabuiú. Um mar de água doce, o terceiro do Semiárido cearense, que minguou e hoje pouco adianta para o "resto de vida" de Elisa Pereira de Sousa e para os dias de centenas de pescadores.
Fosse por ela, já havia partido para tão longe dali. Tentar um prazer na sina, até agora, sem facilidades. Ainda se atreveria, mesmo aos 74 anos e aposentada das pescarias de quase uma vida inteira, na imensidão do açude de Banabuiú. Um mar de água doce, o terceiro do Semiárido cearense, que minguou e hoje pouco adianta para o "resto de vida" de Elisa Pereira de Sousa e para os dias de centenas de pescadores.
Em cinco anos, a seca sumiu com quase toda a chuva que dava sentido ao Banabuiú e às diversas existências dele. Os invernos, propõe dona Elisa, terão de vir em “dilúvios” para ressuscitar o que deixou de viver por causa do volume quase morto do reservatório. Atualmente, com menos de 1% de um bilhão e 600 milhões m³que cabem nele. Uma cratera enorme e funda que submergiu da estiagem.
Ir tão longe, para Elisa Pereira, tem destino definido. Juntar-se ao filho que “mais quer bem” e que a deixa morta de saudade. Antônio Pereira, 42, o mais velho, foi montar rancho, há quatro meses, com o irmão Leonildo, 27, nas beiras d’água do Pará. Migraram. Foram pescar para outro patrão, tentar escapar da falta do que fazer e ganhar pra família viver.
Com o fim dos peixes na barragem do Banabuiú, no município que tem o mesmo nome e se esquadrinha no Sertão Central cearense, dezenas de filhos e maridos da vila do Boqueirão fizeram o mesmo. Partiram para os estados do Norte (também o Tocantins), onde as águas não costumam findar. “Quase toda semana vai um”. É a fala de quem ficou.
Pescadora desde criança para sobreviver e, depois, criar os seis filhos sem ajuda do marido “que vivia bêbado” e morreu assassinado na barragem, Elisa Pereira não titubeia. “Basta um saco de anzol e outro de linha, sou das águas”, diz. Ela teve para fazer um empréstimo no banco e pegar o avião, mas ponderou. “Tô vendo. Não tenho apego por isso aqui. Meu anjo da guarda (o filho Antônio), que ia comigo para o açude desde pequeno, tá lá”, confessa.
Em queda- Ir embora “do açude” se tornou uma necessidade. Ou vai ou dificilmente terá algum ganho em meio à segunda grande seca com duração de cinco anos consecutivos no Ceará. A primeira foi de 1979 a 1983.
Genival Maia Barreiros, 60, presidente da Colônia Z-14 de Pescadores Profissionais, Artesanais e Aquicultores de Banabuiú, faz as contas. A produção de pescados caiu de 60 toneladas, por semana, para meia tonelada. “Quem pegava 200 quilos por dia hoje está trazendo dois ou três quilos. Isso quem consegue pegar”, lamenta Genival.
O Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), responsável pela gerência do açude, anotou 83.425 toneladas de peixes retiradas do Banabuiú em 2013. No ano passado, a tragédia de 1.326 quilos.
Deserto - Pela experiência, Genival Maia calcula que pelo menos três mil famílias de pescadores estão passando necessidade. “Antigamente, os beiços d’água eram cheios de ranchos (cabanas improvisadas para as jornadas de pesca). Hoje não tem mais”, relata.
Diz Genival que nem a feira livre, toda sexta, resistiu. Havia uma variedade de produtos e negócios gerados dos diversos usos do açude. Mas o peixe era a principal moeda da economia do município de Banabuiú. “Há quatro anos, a beira do rio era um mundo de barcos, hoje…”, ressente Genival.
Demitri Túliodemitri@opovo.com.br Foto: Fabio Lima OpovoOnLine.
Demitri Túliodemitri@opovo.com.br Foto: Fabio Lima OpovoOnLine.
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